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Metade das pessoas que criam metas de Ano-Novo desiste antes do Carnaval, diz pesquisa

Objetivos irreais e falta de planejamento são as principais causas desse resultado, aponta especialistas ouvidos pela reportagem

Por Estadão Conteúdo 16/02/2020 11h11
Metade das pessoas que criam metas de Ano-Novo desiste antes do Carnaval, diz pesquisa
Guardar dinheiro é a principal meta financeira para 2020, diz pesquisa - Foto: DR

Ainda não chegou o Carnaval, mas muitos que começam a ler este texto já desistiram de cumprir as suas resoluções de Ano-Novo. Estudo do Statistic Brain Research Institute mostra que 50% das pessoas que fazem planos para o ano mudam de ideia já em janeiro, e 27% nem esperam a virada e já desistem das promessas no final de dezembro. 

Objetivos irreais e falta de planejamento são as principais causas desse resultado, aponta especialistas ouvidos pela reportagem. "A meta criada precisa estar de acordo com os valores de vida, ser relevante e trazer um impacto positivo para a pessoa. Imagine alguém querendo crescer na empresa, mas sabe que isso vai afetar a sua família, que é o mais importante para ela? Claro que ela vai arrumar uma maneira de sabotar o trabalho", diz Douglas Maluf, life trainer e idealizador do Método MD - Inteligência Emocional.

Para o profissional, é preciso ter uma "conexão racional e emocional" com esse desejo. Esse foi exatamente o caso da produtora de marketing de conteúdo, Natalia Padalko, 32. Ela sabotava todo trabalho por onde passava até perceber que não gostava do lugar de onde trabalhava ou da proposta da empresa em que estava.

"Queria crescer na empresa. Mas como eu conseguiria um cargo de confiança em um lugar que vende defensivos agrícolas se sou contra agrotóxicos?", lembra a produtora. Ao perceber quais eram seus valores mais importantes, Padalko se planejou para estudar, fazer cursos e pediu demissão. "É um processo de autoconhecimento longo. Mas hoje, eu trabalho em casa e aceito apenas clientes que tenham valores parecidos com os meus".

Com essa questão maior resolvida e novas metas desenhadas, ainda é preciso pensar no planejamento. Essa fase exige um pensamento invertido da situação. "As pessoas fazem planos pensando no resultado que elas querem chegar, e a primeira pergunta a fazer é: o que vou precisar mudar na minha rotina para atingir essa meta. Se quero ler tantos livros no ano, em que momento eu vou ter tempo de fazer isso?", pontua o psicólogo Ronaldo Coelho.

"Se a ideia é comprar um carro, por exemplo, é preciso checar se é possível economizar, cortar gastos ou arcar com a parcela de um financiamento sem se perder no meio do caminho", completa o especialista. 
Por isso é importante adequar os seus objetivos à sua realidade de vida. A analista de negociações imobiliárias Juliana Lima da Costa, 38, acredita que os problemas financeiros são o maior entrave para ela cumprir novas metas. Ela ficou dois anos desempregada, acumulando dívidas e engordou 23 kg. "Fiz seis anos de muay thai e ainda tento voltar aos exercícios", diz Costa. Ela resolveu pagar uma academia mais simples e está conseguindo ir uma vez por semana, porque seria melhor do que não fazer nada. "Não desisti, mas o ritmo está bem lento", reflete ela. 

Costa não tem certeza de que manterá o ritmo na academia, mas adequar a meta à sua própria realidade é uma das regras para sair da inércia. "Não raro temos a tendência em estabelecer prazos irreais. Um exemplo é estipular um programa de quatro horas de estudos por dia de um novo idioma, quando esse tempo não existe. É muito mais eficiente estudar durante uma hora e ser constante", avalia Maluf. 

Se algo não sai do lugar repetidas vezes, é também o caso de entender se há questões mais profundas por trás do problema. "Emagrecer não tem só a ver com planejamento, tem a ver com aceitação, com sexualidade. Há casos de adolescentes que engordam para se proteger do assédio e isso não é algo consciente", lembra Coelho. "Em relação ao dinheiro, há pessoas que vem de uma origem humilde e sentem culpa do sucesso financeiro, por isso boicotam seus planos de ganhos".

'O cérebo é seu maior inimigo'

O cérebro é o nosso maior inimigo, segundo Fernando Gomes, neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas de São Paulo. O órgão corresponde a 2% do peso do nosso corpo e consome muita da nossa energia. "Por isso, ele adora processos fáceis de serem resolvidos. O seu cérebro não quer te tirar da zona de conforto", explica o médico. 

Por esse motivo, não dá para tirar muitos momentos de prazer, nem exigir demais de uma vez só. "Imagine que se você tivesse que aprender a mexer no seu computador todos os dias? Seu cérebro ficaria estressado. Então, é preciso adquirir novos conhecimentos e novos hábitos, aos poucos", explica o médico.

Além de pegar leve consigo mesmo, é preciso pensar na repescagem. "As metas vêm acompanhadas de atos progressivos e a pessoa precisa checar se está evoluindo como imaginava. Se for o caso, mudar ou adaptar a estratégia". Gomes lembra que casos mais difíceis, como parar de fumar, também podem ser feitos de maneira gradativa. "É uma dependência química, então se a pessoa reduzir um cigarro por mês, vai demorar, mas vai chegar o dia em que ela ficará sem".

A teoria das pequenas vitórias também funciona muito bem, principalmente, em relação a exercícios físicos. "Quem deseja ser corredor de rua precisa passar por um processo. Ele vai ter preparar o seu corpo e vai aumentando suas metas aos poucos. Depois de algum tempo, ele vai conseguir terminar uma prova, por exemplo, sem a exigência de competir", avalia o neurocirurgião. 

Hosana Celeste, 48, está passando por essa experiência. A pesquisadora e professora universitária começou a correr quando perdeu a irmã como forma de aliviar o luto. No ano passado, ela decidiu que iria intensificar os exercícios e aliar a viagens. "Eu quis correr em lugares inusitados, pelo mundo. Fui para Cuba, Amazônia, Espanha e Escócia", conta ela. 

Celeste tinha dinheiro guardado e fez um planejamento para estar em todos esses lugares. "É preciso ter o pé no chão. Fui a países onde conseguia trabalho por um período e onde tinha amigos que pudessem me receber. Com tudo isso, a viagem já fica 50% mais barata." A pesquisadora conseguiu evoluir e já corre 7 km. "Conheci um grupo de maratonistas e a minha meta é chegar ao preparo deles", conta ela.

Para este ano, Hosana já começou vencendo. "Meus amigos disseram para eu desistir de trabalhar com pesquisa no Brasil. Sou insistente e mesmo com todos os cortes no setor, eu consegui colocação em duas instituições", conta Celeste. Como um dos trabalhos é no Rio Grande do Sul, ela já planeja fazer viagens e mais corridas ao redor do estado.